Por que é tão
difícil adquirir bons hábitos e se livrar dos ruins?
Vale a pena a leitura!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Mudar os hábitos exige planejamento, disciplina, força de vontade e um tempo de
adaptação
Acordar cedo, escovar os dentes, colocar o cinto de
segurança no carro, dormir tarde, beber café. O nosso dia a dia está recheado
de hábitos, do momento em que acordamos até voltarmos para a cama, e nem nos
damos conta de quantas vezes fazemos todas essas coisas. É a "força do
hábito", costuma-se dizer, e segundo o psicólogo Antonio Carlos Amador
Pereira, professor da PUC-SP, esses "são comportamentos há bastante tempo
instalados e que são repetidos sistematicamente, até sem pensar". E
mudá-los exige planejamento, disciplina e força de vontade.
Os hábitos são construídos a partir da recompensa
que temos com a sua execução, como acionar o interruptor e a lâmpada se acender
ou, se o desejo é ser bem recebido, sorrir para as pessoas, que irão,
provavelmente, sorrir de volta. De tão arraigados, fica difícil mudar os que
são considerados ruins, como procrastinar ou roer as unhas. Adquirir novos bons
hábitos também é mais difícil do que costumamos achar, e um exemplo disso é a
lista de resoluções a cada começo de ano. Traçar metas é fácil; colocar em prática,
nem sempre.
Para o autor de "Making Habits, Breaking
Habits: Why We Do Things, Why We Don't and How to Make Any Change Stick"
(em tradução livre, "Criando Hábitos, Perdendo Hábitos: Por Que Nós
Fazemos Coisas, Por Que Não e Como Fazer Qualquer Mudança Durar"), escrito
pelo psicólogo inglês Jeremy Dean e ainda sem previsão de lançamento no Brasil.
- além da repetição
automatizada, o hábito se caracteriza pela falta de emoção. Um exemplo é
acordar cedo para quem costumava acordar tarde. Nos primeiros dias, é um drama,
e o sono parece não ir embora ao longo do dia. Após algumas semanas e meses, o
acordar torna-se automático. "Os hábitos têm importância para economizar
energia", afirma o psicólogo Pereira. Ou seja, uma vez acostumado, o organismo
passa de gastar menos energia para executar a ação repetitiva e a guarda para
outras situações.
O tempo para que um hábito entre na rotina varia de
acordo com o tipo de ação e, claro, de quem a executa. O psicólogo inglês cita um
estudo feito pela University College London em que 96 pessoas foram convidadas
a escolher uma ação para se tornar hábito. A maioria escolheu algo relacionado
à saúde, como comer uma fruta por dia ou caminhar 15 minutos à noite. Depois de
quase três meses de estudo, os participantes indicaram se eles tinham ou não
adquirido o novo hábito.
Os resultados mostraram que, em média, os
participantes levaram 66 dias para atestar que a ação tinha se tornado hábito.
Assim como os hábitos variavam, o
tempo para adquiri-los, também. O participante que decidiu tomar um copo com
água todo dia após o café da manhã conseguiu o hábito em 20 dias. Já quem
preferiu inserir a fruta após o almoço levou o dobro do tempo.
Criando hábitos
Criar um novo hábito exige comprometimento. Para o
psicólogo da PUC-SP, também são necessários motivação e, claro, repetição.
Entre as dicas que o psicólogo Dean dá em seu livro, ele sugere começar
anotando em um papel o hábito que você quer estabelecer; depois, escreva o que
há de melhor no resultado do seu hábito; em seguida, os obstáculos que você
deverá enfrentar. Por último, trace um plano específico, que é chamado pelo
autor de "intenção de implementação".
O que ele quer dizer com a "intenção" é
criar um plano, mas não o plano básico que todo mundo faz, como "neste ano,
eu vou perder peso" ou "serei mais gentil com as pessoas",
porque eles tendem a ser vagos. O autor orienta que, em vez de dizer que vai
ficar em forma, escreva: "Se eu vou percorrer um trajeto curto, então eu
devo ir a pé".
Se o objetivo é ter o hábito de ser mais gentil,
estabeleça atitudes específicas, como: "Se eu vir um cadeirante tendo
dificuldade para circular em uma calçada, então oferecerei ajuda". Para o
autor, isso liga uma situação a uma resposta direta, uma ação. O segredo está
na relação entre o "se" e o "então", em vez do simples
"eu vou ajudar mais as pessoas" ou "eu vou ficar em
forma".
É bom ter cuidado com a autossabotagem. Por
exemplo: se você quer praticar um instrumento musical toda quarta-feira quando
chegar do trabalho, provavelmente você estará cansado e desmotivado. Logo,
"se" você chegar em casa sem vontade de tocar, mas está realmente
comprometido a aprender, "então" você ouvirá um pouco de música para
ficar inspirado e tomar coragem.
Para aumentar as chances de esse exercício dar
certo, o ideal é começar um hábito de cada vez. "Lembre-se que a sua
rotina inspira conforto e que é fácil querer voltar para ela. Então, o melhor é
começar aos poucos", orienta Dean. À medida que for alcançando sucesso, é
hora de inserir um novo hábito, até que ele consiga se estabelecer.
Perdendo hábitos
Livrar-se dos hábitos ruins exige, antes de tudo, o
reconhecimento de que ele não é bom para quem o tem ou para quem convive com a
pessoa. "Um hábito é prejudicial quando ele afeta negativamente nossa
qualidade de vida, interferindo em aspectos da nossa saúde ou em dimensões
pessoais, sociais, profissionais ou emocionais", diz a psicóloga Talita
Pereira Dias, especialista em terapia comportamental e doutoranda em psicologia
pela UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos).
Para o psicólogo Dean, o problema em se livrar de
um hábito está no fato de ser uma ação que envolve o inconsciente, e essa é uma
área do cérebro que não conseguimos alcançar diretamente. "Nossa vontade
consciente de mudar se mostra muito fraca em comparação ao comportamento que
temos automaticamente", diz.
Em seu livro, ele compara o desejo de se livrar de
um hábito com a missão de mudar o curso de um rio. Não dá para, simplesmente,
construir uma barragem e esperar que a água pare de correr. Ela transbordará e
inundará as áreas vizinhas para continuar seu curso. A saída é
"encorajar" o rio a seguir outro caminho, criar um novo percurso.
Portanto, para se livrar de um velho hábito ruim, é preciso criar um hábito
bom.
Se o objetivo é abolir o refrigerante, é só
substituí-lo por outra bebida mais saudável e resistir à tentação naqueles dias
de intenso calor. Uma vez que o hábito ruim foi identificado, que se criou o
comprometimento de se livrar dele e você sabe qual é o novo hábito que
substituirá o antigo, é só colocar em prática o plano de ações. É bom também
ficar alerta: mesmo após um novo hábito ter sido estabelecido, o antigo estará
lá, quietinho, esperando a hora de ser reativado.
O desafio é ficar vigilante e praticar o
autocontrole. Às vezes, vale até criar obstáculos para o hábito ruim.
Suponhamos que você não quer mais comer algo que não te faça bem. Então,
experimente não comprar o determinado ou alimento ou não ir naquele restaurante
de sempre. Esse tipo de atitude colabora para alcançar objetivos.
Hábito é diferente de vício
Se um hábito pode ser ruim, um vício é maléfico, e
os dois não podem ser confundidos. "O vício é essencialmente ruim,
envolvendo comportamentos repetitivos que interferem negativamente na qualidade
de vida da pessoa", observa a psicóloga Talita. Para ela, o vício está
intrinsecamente relacionado a consequências negativas, como o tabagismo.
"Além disso, mudar um vício é muito mais
difícil do que mudar um hábito, uma vez que, no caso do vício, há uma relação
de dependência do indivíduo, seja física, fisiológica ou psíquica",
explica.
Também não se pode confundir o hábito ruim com o
TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), distúrbio de ansiedade caracterizado por
obsessões e compulsões. "Assim como o vício, um aspecto que pode fazer com
que as pessoas confundam o TOC com o hábito envolve a repetição de
comportamentos", diz a psicóloga, que orienta, nesses casos, a procura de
um especialista.
Por Claudia Silveira
Do UOL, em São Paulo.